quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A morte nos espreita submersa


Os ventos fortes de agosto coloriam o céu de nossa cidade de pipas. A brisa refrescava o passeio de casais calorosos. Porém, muito mais se escondia por entre a bruma matinal, em meio ao mar revolto. O clima tenso de outras terras era tema apenas para os jornais, tão diferente da realidade cotidiana dos aracajuanos, pois, estávamos em plena Segunda Guerra Mundial. Ninguém esperava que em 15 de agosto de 1942 o mar que antes nos trouxera tanta felicidade viesse a conduzir para nossas praias tanta tristeza. A guerra chegara a nossa porta e exibia seu cartão de visita, centenas de pessoas morreram devido ao torpedeamento de cinco navios mercantes entre a costa de Sergipe e Bahia pelo submarino U-507. A morte nos espreitava submersa enquanto dormia-mos em falsos sonhos de neutralidade.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O signo de uma cidade portuária - II

Era uma noite do dia 4, do mês de agosto do ano de 1861, quando as primeiras luzes do pharôlete, disposto na ponta da Barra do Cotinguiba, apontou ao mar alcançando de seis a nove milhas naúticas. Como foi observado pelos práticos Manuel Francisco dos Santos (Capitão do Vapor Aracaju) e Manuel Romão Teixeira (Prático da Barra do Rio Real). Dez meses se passaram da chegada da lanterna que adornaria essa atalaia ao seu primeiro funcionamento. Todos agora podiam dormir sossegados, pois, uma sentinela nos velava o sono.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

O signo de uma cidade portuária


Já não é novidade para ninguém que fui concebida e criada para ser porta e janela desta terra para o mundo. Eventos, que a pouca idade me impede de recordar, demonstram a angústia de se apostar em sonhos; Sonhos de uma elite visionária que ousou construir uma cidade como adorno de um porto. 
A simples chegada de um barco-reboque, o Vapor Aracaju, que serviria a Associação Sergipense, foi tratada com imensa euforia pelos cidadãos que se apinhavam a beira-mar. Foguetes, brados, gritos de alegria despertavam o Estado de seu estado de dormência, comprovando a realidade do sonho.
(...) "Ao vermos entrar 0 Vapor a par da alle-
gria que nos impressionava pela ideia de
um futuro de prosperidade para esta pro-
vincia, assaltava-nos um doloroso senti-
mento da mais viva saudade..., e dizia-
mos com os olhos humidecidos: --
-- Cinzas de Ignacio Joaquim Barboza!
Descanse sempre em paz!
(CORREIO SERGIPENSE. 10/05/1856)

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

A puberdade de uma cidade



Uma menina-moça surgia. Com 15 anos já desabrochavam as primeiras rosas, seguindo a evolução natural de toda mulher. Deixava para trás os adjetivos jocosos de minha infância feia e desengonçada, como toda menina após a sua menarca. Concebida em meio a onda modernista, me vi adornada de prédios com enormes frontões, portas e janelas em arco. Fui esquadriada, palmo a palmo, com mãos fortes fui modelada pela primeira vez, tal qual um tabuleiro de xadrez. Saltavam aos olhos dos forasteiros, viajantes e marinheiros que por aqui aportaram em busca de aconchego, os meus primeiros atributos. Enebriados com a cor de minhas asas, esqueciam da minha fase de lagarta.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Infância difícil

"Aracaju não é cidade
Nem também povoação
Tem casinhas de palha
Forradinhas de melão". 
(Quadra bairrista; sec.XIX)

Em nenhum momento da minha curta vida tive facilidades, comecei com uma infância pobre, cheia de privações, poucos eram aqueles que vinham me ver. Logo de cara minha família teve que enfrentar uma epidemia, era a Cólera-morbus que assolava o meu Estado entre setembro de 1855 e fevereiro de 1856. Muitos da população a “danada” levou, cerca de 23%, entre eles, aquele que eu mais queria bem, meu pai. Acabei me tornando, antes de cidade, órfã.

sábado, 22 de novembro de 2008

As dificuldades de um parto


“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou minha morte”. Brás Cubas escolheu a morte, mas, como não me equivalho à altura da ousadia de um Machado, começo pelo “uso vulgar”: o nascimento.

Nasci de parto cesáreo, pois teimavam que eu nascesse. Fruto e obra de um homem, Ignácio Barbosa. Deveras haviam outros que reivindicavam a paternidade, mas, como na época não existia teste de DNA, conheci um único pai. Minha genitora, era já uma senhora de idade quando nasci, sofreu muito quando me desvencilhei de seu ventre. Hoje vive só, acabrunhada no alto de um morro, próximo ao rio Paramopama: a Velha São Cristovão.